segunda-feira, 17 de setembro de 2012

O vento solar e a atividade geomagnética

 

16 setembro 2012 – 9:14 PM

Ainda existem muitas lacunas sobre a geração do vento solar e, o que se sabe, é fundamentado principalmente em observações. Isso se deve principalmente à sua complexa origem e à falta de medidas in situ nas regiões onde o mesmo é acelerado. Porém, na órbita da Terra suas características são muito bem conhecidas e constantemente monitoradas. A interação do vento com o campo magnético terrestre leva à criação de diversas regiões distintas da magnetosfera e, uma vez que as condições sejam favoráveis, leva também às chamadas atividades geomagnéticas. O estudo das variações na atividade geomagnética controlada pelas condições do vento solar se faz totalmente justificado do ponto de vista acadêmico. Do ponto de vista prático, tais variações podem, por exemplo, prejudicar o funcionamento de sistemas de solo e a bordo de satélites devido ao aumento das correntes atmosféricas e da radiação que chega até o planeta, aumentando assim a importância desse tipo de pesquisas. Esse artigo apresenta uma breve revisão de alguns dos principais efeitos da interação entre o vento solar e a magnetosfera terrestre.

1. Introdução

As pesquisas em física espacial se concentram principalmente nas interações entre partículas energéticas carregadas e campos eletromagnéticos no espaço interplanetario. Próximo à Terra, a energia da maior parte dessas partículas provém diretamente do Sol ou da interação do vento solar com a magnetosfera terrestre.
Na primeira metade do século XX os cientistas já acreditavam que as auroras fossem causadas por partículas vindas do Sol. Para tanto, essas partículas deveriam viajar até nosso planeta de alguma forma, surgindo assim o primeiro modelo para o que hoje chamamos de vento solar. Primeiramente foi suposto que o vento solar era intermitente. Posteriormente, em 1943, o astrônomo alemão Cuno Hoffmeister notou que as caudas dos cometas não permaneciam na direção oposta a seus movimentos, mas sim em uma direção levemente desviada para o lado oposto ao Sol, fato que não podia ser explicado apenas pela pressão de radiação solar. Finalmente, em 1951, Ludwig Biermann interpretou esse desvio como uma conseqüência da interação da cauda do cometa com o vento solar, soprado ininterruptamente. Em 1957, Hannes Alfvén postulou que o vento solar era magnetizado e que o fluxo de partículas carregava o campo magnético solar enquanto viajava pelo espaço. Em 1958, Eugene Parker formalizou uma teoria concisa para o vento e em 1962 demonstrou que a densidade para o vento solar raramente seria maior que 30 partículas/cm3, em conformidade com os registros magnéticos. A confirmação dos estudos teóricos não demorou a acontecer, dando início assim à era espacial totalmente justificada devido à necessidade de se conhecer a fundo os processos que ocorrem próximos à Terra, não apenas pelos impactos científicos, mas também tecnológicos [1,2].
A região em que o campo magnético terrestre domina os processos em relação ao vento solar é denominada magnetosfera. Esse campo é gerado predominantemente por correntes elétricas que fluem no interior do planeta e, devido à ação/interação do vento solar, a magnetosfera se encontra confinada em uma região finita e bem delimitada do espaço interplanetário [3].
O campo magnético associado ao vento solar controla o acoplamemto entre o vento e a magnetosfera, mediando a transferência de energia através do processo de reconexão magnética. Dessa forma, variações no vento solar afetam a estrutura dinâmica da magnetosfera, refletindo-se em perturbações no campo geomagnético, as chamadas atividades geomagnéticas [4].

2. O Sol

O Sol é a nossa fonte de energia e luz. Pela proximidade com a Terra, ele se torna a estrela de interesse mais imediato para nós e a de mais fácil estudo. De uma forma geral, é uma esfera gigante de gás incandescente, alimentada por reações termonucleares que ocorrem no núcleo.
A Fig. 1 mostra de forma esquemática as principais regiões solares. A fotosfera (photosphere) possui cerca de 400 km de espessura e temperatura da ordem de 5800 K, sendo a camada mais visível. Abaixo da fotosfera se encontra a zona convectiva (convection zone), compreendendo cerca de 15% do raio solar. Abaixo da zona convectiva se localiza a zona de radiação (radiative zone) onde, como o próprio nome já diz, a energia é transportada por radiação. A energia solar é produzida no núcleo (core) por reações termonucleares, a 107 K. Logo acima da fotosfera está a cromosfera (chromosphere), de cor avermelhada e visível apenas durante eclípses. Essa camada se estende por 104 km acima da fotosfera e sua temperatura aumenta da base para o topo, apresentando um valor médio de 15000 K. Por fim, acima da cromosfera se encontra a coroa (corona), que se estende por aproximadamente dois raios solares [5,6].

A fotosfera possui uma aparência granulada, fenômeno conhecido como granulação fotosférica. Os grânulos refletem os topos das colunas convectivas de gás quente que se formam na região convectiva. As zonas mais escuras entre os grânulos são regiões onde o gás mais frio e mais denso escoa para baixo [2]. Nessa região também são formadas as manchas solares, regiões que se mostram mais escuras que o restante da camada. As manchas estão associadas a intensos campos magnéticos e seguem um ciclo de aproximadamente 11 anos, onde sua ocorrência varia entre máximos e mínimos [2,6,7].
Por emitir radiação muito mais fraca que a fotosfera, a cromosfera não é visível a olho nu, a não ser durante eclipses solares totais, onde o intenso brilho da fotosfera é ofuscado pela Lua. Possui uma aparência ondulada por causa da presença de estruturas chamadas espículas, jatos de gás que se elevam a até 104 km acima da borda e duram poucos minutos. As temperaturas nessa camada variam entre cerca de 4300 K na base e mais de 40000 K no topo [5]. Acredita-se que a fonte de energia para esse aumento de temperatura sejam campos magnéticos variáveis formados na fotosfera e transportados para a coroa por correntes elétricas, perdendo parte de sua energia na cromosfera.
Acima se encontra a coroa, que possui temperaturas da ordem de 106 K. A fonte de energia da coroa provavelmente é a mesma da cromosfera; transporte de energia por correntes elétricas induzidas por campos magnéticos variáveis. Nessa região se encontram os buracos coronais, regiões mais escuras da coroa e que estão associados a linhas de campo “abertas”, semelhantes às regiões polares da Terra. Em épocas de baixa atividade solar os buracos coronais se confinam em regiões de altas latitudes, enquanto em períodos ativos ocorrem também em latitudes menores. Dessas regiões emana o vento solar rápido [8].
Sabe-se que a potência emanada do Sol é de cerca de 4 x 1024 Watts.2 Já no século IXX os astrônomos sabiam que essa energia não poderia ser gerada por combustão. Em 1937 Hans Albrecht propôs a fonte aceita para a energia do Sol, as reações termonucleares, onde basicamente quatro prótons são fundidos em um núcleo de hélio, liberando energia. O Sol possui hidrogênio para alimentar essas reações por bilhões de anos e, à medida que diminui a quantidade de hidrogênio no núcleo, aumenta a quantidade de hélio [5, 6].

3. O vento solar

O vento solar é um fluxo de partículas ionizadas, predominantemente núcleos de hélio ionizados e elétrons. É resultado da enorme diferença de pressão entre a coroa solar e o espaço interplanetário, sendo empurrado para longe do Sol apesar da grande atração gravitacional que sofre. Como o gradiente de pressão decresce com o inverso da distância radial, mais lentamente que a atração gravitacional que decresce com o inverso do quadrado da distância, o vento é acelerado a velocidades muito altas, da ordem de centenas de quilômetros por segundo [2].
Por possuir uma origem muito complexa e pela inexistência de medidas in situ, ainda restam muitas lacunas a serem preenchidas sobre a geração do vento solar. Diferente de outras áreas da física, o conhecimento de suas propriedades é mais baseado em observações do que em fundamentação teórica. Porém, na órbita da Terra suas características são bem conhecidas. Sua velocidade e densidade médias nessa região são de 400 km/s e 5 partículas/cm3, aproximadamente. Apresenta um campo magnético de cerca de 5 nano Tesla (nT) com uma configuração espiralada [1]. Devido à sua constante expansão, suas características são bastante variáveis a depender da região do espaço sob análise. Por exemplo, as colisões entre íons e elétrons na região da coroa são bastante comuns, enquanto no espaço interplanetário elas são extremamente raras. Além disso, suas características variam muito de acordo com a atividade solar e de acordo com a região do Sol de onde os feixes são provenientes [6].
Em relação à região geradora, o vento pode ser dividido em vento solar rápido e vento solar lento. O vento rápido é originado nos buracos coronais, regiões mais frias e menos densas da coroa solar, podendo atingir picos de velocidade da ordem de 900 km/s. Estão associados a linhas de campo magnético “abertas”, semelhantes às de um pólo magnético, facilitando assim o escapamento das partículas carregadas. Já o vento lento se origina em regiões de baixas latitudes, mais próximas ao equador do Sol, atingindo velocidades da ordem de 300 km/s. Em geral o vento solar lento é mais denso e apresenta um comportamento mais irregular [9].
Sendo o vento solar um plasma altamente condutor, ele transporta consigo as linhas de campo magnético do Sol. Esse fenômeno é conhecido como “congelamento” das linhas de campo magnético. Para entendê-lo melhor, consideremos a seguinte equação que descreve a variação temporal de um campo magnético no interior de um plasma onde u é a velocidade média das partículas do plasma e ηm é a viscosidade magnética, dada por ηm = 1/μoσ0, sendo μ0 a permeabilidade magnética do vácuo e σ0 a condutividade elétrica do meio. Essa equação pode ser obtida combinando-se a equação da lei de Ohm generalizada com as equações das leis de Faraday e da lei de Ampère em sua forma reduzida (sem o termo da corrente de deslocamento), além da identidade vetorial
O primeiro termo do segundo membro da Eq. (1) é chamado termo de fluxo do campo magnético, enquanto o segundo termo é conhecido como termo de difusão. Para comparar qual desses termos e mais importante em cada tipo de plasma, consideremos a análise dimensional de cada um deles, aproximadamente
onde L denota algum comprimento característico para a variação dos parâmetros envolvidos. A razão entre o termo de fluxo e o termo de difusão é chamado número magnético de Reynolds e é dado por
Em muitos tipos de plasmas Rm é muito grande ou muito pequeno se comparado à unidade. Se Rm << 1o termo de difusão domina e a Eq. (1) se reduz à equação de difusão do campo magnético
Nos plasmas onde Rm >> 1o movimento relativo entre o campo e as partículas é completamente diferente. Nesse caso, o termo de fluxo é dominante em relação ao termo de difusão e a Eq. (1) se reduz a
Essa equação significa que em um plasma de alta condutividade as linhas de campo magnético se movem juntamente com o fluido, “congeladas”, ao invés de simplesmente se difundirem pelo plasma como no caso da Eq. (5).
Assim, o campo magnético interplanetário nada mais é do que uma expansão do campo magnético solar. Devido a esse “congelamento” e ao fato do Sol apresentar uma rotação diferenciada em relação a diferentes latitudes, o aspecto do campo magnético se torna espiralado, como mostrado na Fig. 2.

Entretanto, em sua viagem o vento solar encontra localmente obstáculos à sua propagação, que não chegam a influenciar sua dinâmica global. Campos magnéticos que se manifestam na forma de magnetosferas planetárias funcionam como escudos à sua penetração [3]. No caso específico da Terra, a interação vento solar-magnetosfera deforma a configuração normal do campo magnético terrestre, criando várias regiões distintas de plasma e gerando várias perturbações em seu interior na forma de atividades magnéticas. Essas atividades são reflexo da maior ou menor entrada de partículas/energia na magnetosfera, se manifestando na forma de tempestades e subtempestades magnéticas, por exemplo [8].

4. Interação vento solar-magnetosfera terrestre

A magnetosfera é a região onde o campo geomagnético domina os processos sobre as partículas carregadas. Esse campo é gerado em sua grande maioria por correntes que fluem no interior do planeta, possuindo pequenas contribuições dos sistemas de correntes atmosféricas do conjunto magnetosfera-ionosfera. A representação do potencial real do campo geomagnético exige um grande esforço matemático e pode ser representado por uma série de harmônicos esféricos, dada pela expressão:
onde e são coeficientes, cos(Θ) são os polinômios associados de Legendre, RE é o raio da Terra e as variáveis R, Θ e fsão coordenadas esféricas [4]. Essa expressão representa a solução da equação de Laplace.
O potencial dado pela Eq. (7) e os coeficientes são derivados de observações globais, feitas tanto em solo como por satélites. Por causa da variação secular do campo magnético, que são alterações lentas impostas por mudanças nos padrões de correntes do interior do planeta, existem coeficientes diferentes para épocas diferentes. Essa equação deve ser completamente válida em todos os níveis se todas as contribuições internas (devido ao campo magnético gerado no interior do planeta) e externas (geradas pelas correntes ionosféricas e magnetosféricas) forem incluídas. No entanto, as correntes externas são variáveis e seus efeitos na superfície da Terra são pequenas. Assim, e comum expandir apenas os termos relacionados ao campo principal, sendo a aproximação válida para pontos não muito distantes do planeta. Para regiões muito afastadas as correntes atmosféricas começam a ganhar importância e os termos relacionados a elas devem ser incluídos na solução da Eq. (7) [2,4,6].
A cavidade magnetosférica é formada porque o vento solar e o campo magnético interplanetário “congelado” contornam a magnetosfera, não podendo penetrá-la diretamente. Seu tamanho e determinado pelo equilíbrio entre a pressão dinâmica do vento solar e a pressão magnética exercida pelo campo geomagnético [3]. Além disso, seu formato é influenciado pelo arraste exercido pelo vento ao contorná-la. Do lado diurno a magnetosfera se estende por aproximadamente 10 raios terrestres (1 RT 6370 km), enquanto do lado noturno se estende por cerca de 80 RT [11]. A região noturna é conhecida como cauda magnetosférica, constituindo um reservatório natural de plasma e energia. A Fig. 3 mostra de uma forma simplificada as principais regiões da magnetosfera.

A região que separa os regimes de campo geomagnético e interplanetário e chamada magnetopausa. Em todos os pontos dessa região a pressão dinâmica exercida pelo vento solar e equilibrada pela pressão magnética do campo geomagnético.
A magnetosfera constitui um objeto relativamente sólido em relação ao plasma do vento solar e, sendo o vento um fluido que viaja a velocidades maiores que a velocidade característica do meio,3 é formada uma onda de choque quando as partículas começam a sentir a presença da barreira. Do lado diurno, essa região se encontra em média entre 2 e 3 RT à frente da magnetopausa, sendo caracterizada por mudanças drásticas nas propriedades das partículas [8]. Na região do choque o vento solar é desacelerado, aquecido e defletido ao redor do planeta. O aquecimento resulta da dissipação de energia cinética em energia térmica.
A região entre o choque e a magnetopausa apresenta propriedades diferentes das propriedades de ambos o vento solar e a magnetosfera, sendo chamada de bainha magnética e caracterizada por forte turbulência [7].
Existem regiões em altas latitudes ao redor dos pólos magnéticos onde as partículas solares podem penetrar com facilidade. Essas regiões estão associadas a linhas de campo verticais em relação à superfície do planeta, facilitando assim a penetração das partículas carregadas e são chamadas cúspides polares [2].
A cauda magnetosférica, a região da magnetosfera que se alonga na região noturna, compreende basicamente dois regimes distintos de campo magnético, chamados lóbulos da cauda. No lóbulo norte as linhas de campo são direcionadas para o planeta, enquanto no lóbulo sul as linhas são divergentes. Separando os dois lóbulos existe a lâmina de plasma, evitando que aconteça uma aniquilação mútua entre os mesmos. A magnetocauda é a região mais notável da magnetosfera, sendo a fonte dos fenômenos sentidos em solo que afetam a vida humana no planeta. Sua existência se deve ao processo de reconexão magnética, onde as linhas de campo geomagnético se conectam às linhas de campo do vento solar. Desde que o vento arrasta o campo interplanetário à medida que se move, as linhas de campo terrestres tendem a serem também carregadas, alongando assim o campo magnético do lado noturno do planeta [2, 6].
A região magnetosfíérica de linhas de campo fechadas é caracterizada por apresentar um plasma mais denso, mais frio e de menores energias. Essa região mais interna é chamada de plasmasfera, sendo separada da magnetosfera externa pela plasmapausa. No plano equatorial a plasmapausa fica a uma distância média de aproximadamente 4RT do planeta [9].
Todas essas regiões da magnetosfera são resultantes de sua interação com o vento solar, sem o qual não existiriam da forma que as conhecemos.

5. Reconexão magnética

A magnetosfera compreende um sistema muito dinâmico, altamente influenciado pelas condições do vento solar, tais como pressão dinâmica, velocidade, densidade e campo magnético. No que diz respeito à entrada de energia/partículas na magnetosfera, o fator predominante é o processo de reconexão magnética, responsável pela manutenção do acoplamento magnetosfera-vento solar [6].
Como o vento solar é altamente condutor, as linhas de campo interplanetário são transportadas com ele. Assim, a entrada de energia na magnetosfera somente será possível se houver um aniquilamento entre o campo interplanetário e o campo geomagnético. Essa situação é atingida quando o campo magnético interplanetário é orientado na direção oposta ao campo geomagnético e, quando isso acontece, as partículas carregadas do vento conseguem fluir para o interior da magnetosfera. Em outras palavras, os fluidos do vento e da magnetosfera só entram em contato se a condição de congelamento for quebrada, permitindo a difusão das partículas em relação ao campo [7].
Como na parte diurna da magnetosfera o campo geomagnético é orientado para o norte, a reconexão ocorre mais comumente quando o campo interplanetário é dirigido para o sul. A Fig. 4 mostra de forma simplificada o processo de reconexão para o caso de campo interplanetário predominantemente sul.

Além da orientação do campo interplanetário, sua intensidade também é muito importante para que ocorra a reconexão. Campos intensos e de grande duração levam a uma maior transferência de energia para a magnetosfera. Já dentro da magnetosfera essas partículas provenientes do vento solar são responsáveis pelas variações nos sistemas de correntes e campos, sendo seus efeitos chamados de atividades geomagnéticas [12].

6.  Subtempestades magnéticas

Subtempestades magnéticas são o tipo mais freqüente de atividade geomagnética, sendo constituídas pelos distúrbios que ocorrem na magnetosfera e na ionosfera quando o campo magnético interplanetário é dirigido para o sul, aumentando assim o fluxo de energia que é transportado do vento solar para o interior da magnetosfera [8]. Se o campo magnético interplanetário permanecer voltado para o sul por um longo tempo, uma tempestade magnética pode se desenvolver.
As subtempestades são processos dissipativos da energia magnetosférica que é armazenada através da interação com o vento solar, causando várias perturbações nas regiões terrestres de altas latitudes, tais como o surgimento de auroras e o aumento da densidade de corrente do eletrojato auroral4 [13].
Em geral as subtempestades são caracterizadas por três fases distintas, chamadas fase de crescimento, fase de expansão e fase de recuperação. Durante a fase de crescimento a energia extraída do vento solar é armazenada na magnetosfera. A fase de expansão corresponde à liberação ou recarregamento da energia armazenada, enquanto a fase de recuperação é o retorno da magnetosfera às suas condições normais [2, 6].
Subtempestades típicas têm em média duração entre 1 e 3 horas e amplitudes de perturbação da ordem de 200 a 2000 nT, sendo caracterizadas pelo índice de atividade auroral AE (Auroral Electrojet). Esse índice foi introduzido em 1966, com o intuito de caracterizar a influencia do eletrojato auroral nas variações no campo magnético terrestre nas regiões polares (altas latitudes). Apenas a componente horizontal BH do campo magnético é usada para sua obtenção [14].

7.  Tempestades magnéticas


Há muito tempo já se sabe que a componente BH do campo magnético terrestre sofre decréscimos durante períodos de intensa atividade magnética, recuperando seus valores médios de uma forma gradual e suave. Esse declínio global na componente horizontal caracteriza uma tempestade magnética, que em geral começa quando o acoplamento entre o vento solar e a magnetosfera se torna forte e prolongado o suficiente, tornando intensa a atividade magnética.
Durante uma tempestade são injetadas partículas provenientes do vento solar na magnetosfera interna. Essas partículas se movem ao redor da Terra, sendo que os prótons derivam para oeste e os elétrons para leste. Essas derivas são causadas por gradientes e curvaturas do campo geomagnético. As partículas injetadas enriquecem a chamada corrente de anel, um sistema de correntes de leste para oeste que circula a Terra em latitudes equatoriais, diminuindo o valor da componente BH do campo magnético terrestre na superfície de praticamente todo o planeta. Além disso, as tempestades são caracterizadas pela aceleração e termalização de partículas da lâmina de plasma e da corrente de anel, provocando ainda os fenômenos conhecidos como auroras [15].
Tempestades típicas são constituídas de três fases bem definidas, classificadas de acordo com o índice Dst. Esse índice é definido como a média instantânea mundial da perturbação da componente BH no solo na região equatorial, sendo dado em nT e servindo como indicador da atividade magnetosférica em escala global [6].
A principal característica do início de uma tempestade é, em geral, um aumento súbito nos valores de BH, causado pelo aumento da pressão dinâmica exercida pelo vento solar sobre a magnetosfera. Esse aumento de pressão eleva as correntes na magnetopausa, produzindo perturbações positivas na componente horizontal do campo na superfície da Terra. Caracterizado por valores positivos do índice Dst, esse começo é chamado de fase inicial da tempestade, podendo perdurar por algumas horas. Essa fase é seguida pela fase principal, caracterizada por um decréscimo rápido e às vezes altamente perturbado da componente BH e, consequentemente, de Dst. Esse decréscimo é causado pelo aumento da injeção de partículas na corrente de anel. Porém, o aumento na corrente de anel ocorre até um valor assintótico, onde a taxa de injeção e a taxa de perda de partículas se tornam equivalentes. À medida que o campo magnético interplanetário se torna mais fraco, ou inverte sua polaridade para o norte, a injeção de partículas na magnetosfera diminui, o crescimento da corrente de anel cessa e as perturbações começam a diminuir. Tem início assim a fase de recuperação da tempestade, onde os valores da componente BH e de Dst retornam lentamente aos seus valores habituais [2, 12].

8. Auroras

Varios fenômenos celestes têm sido observados e admirados ao longo da história humana, mas poucos causaram tanta fascinação, espanto e medo como as auroras. Também chamadas de luzes do norte e luzes polares, certamente estão entre os fenômenos mais espetaculares da natureza e, por serem visíveis a olho nu, constituíram a primeira manifestação constatada da interação vento solar-magnetosfera. São a assinatura óptica da precipitação de partículas carregadas e suas interações com os constituintes atmosféricos [2, 6]. A maior incidência das auroras acontece nas regiões chamadas ovais aurorais, que são duas regiões de formato oval em volta dos pólos geomagnéticos.
As partículas características que produzem as auroras possuem energias de menos de 100 eV a algumas centenas de keV, penetrando na atmosfera e causando excitação e ionização das partículas atmosféricas. Próximo à Terra, essas partículas são encontradas principalmente em latitudes magnéticas maiores que 55°, em ambos os hemisférios [11]. Durante períodos de baixa atividade solar as auroras se concentram em maiores latitudes, enquanto que em períodos muito ativos elas ocorrem também em latitudes medias.
O espectro gerado pelas auroras e constituído por várias linhas e bandas de emissão, com comprimentos de onda do ultravioleta ao infravermelho. As partículas que se precipitam perdem parte da energia cinética através de colisões, excitando os constituintes atmosféricos. Quando esses constituintes decaem para estados menos energéticos, ou para o estado fundamental, a diferença de energia entre os dois estados envolvidos na transição e liberada na forma de fótons, gerando assim radiação no visível, infravermelho e ultavioleta. Dessa forma, as linhas e bandas de emissão geradas pelas auroras podem ser usadas para o estudo das partículas atmosféricas, uma vez que cada átomo ou molécula diferente possui espectros de emissão diferentes [2, 6, 8].
Em geral, a radiação de uma aurora e proporcional à energia das partículas que se precipitam, enquanto a altura em que as auroras ocorrem e relacionada às energias e também ao ângulo de arremesso das partículas,5 além de depender também da composição atmosférica [8,12].
Estudos feitos já na década de 50 mostraram que as auroras ocorrem predominantemente entre 95 e 105 km de altura, embora algumas aconteçam até mesmo a mais de 500 km acima da superfície do planeta. Em média, as auroras diurnas se dão em alturas entre 100 e 200 km maiores que as auroras noturnas [2]. Isso se deve ao fato do maior bloqueio imposto pelo campo magnético no lado diurno, dificultando uma penetração mais profunda na atmosfera.

9. Radiação Quilométrica Auroral -AKR

A magnetosfera da Terra é um emissor natural de ondas eletromagnéticas. Emissões intensas de ondas de radio ocorrem em aproximadamente algumas centenas de kHz. Uma vez que o comprimento de onda dessa radiação e da ordem de quilômetros, foi chamada inicialmente de Radiação Quilométrica Terrestre (TKR, do inglês Terrestrial Kilometric Radiation), recebendo posteriormente a denominação Radiação Quilométrica Auroral (AKR, do inglês Auroral Kilometric Radiation), por estar intimamente relacionada à aceleração de elétrons na região auroral [16, 17]. A radiação só foi descoberta nas últimas décadas, pois suas freqüências são blindadas pela ionosfera, so podendo ser detectada por satélites ou espaçonaves.
Apesar de ser a mais intensa, a AKR não e a única emissão de ondas da magnetosfera. Devido às várias regiões distintas, caracterizadas por condições particulares de campo magnético, temperatura de plasma, densidade de partículas etc, a magnetosfera terrestre possui várias outras emissões de ondas, tanto eletrostáticas quanto eletromagnéticas [16].
A AKR é gerada por elétrons que se precipitam na parte noturna da magnetosfera terrestre, a distâncias relativamente pequenas da Terra, ocorrendo em rajadas que duram por períodos de meia hora até várias horas. A sua ocorrência está relacionada com a ocorrência de auroras [18, 19]. Ambos os fenômenos, AKR e auroras, se originam da interação entre o vento solar e a magnetosfera, representando as etapas finais de um processo de liberação explosiva de energia acumulada na cauda geomagnética.
De uma forma geral, a radiação se origina em altitudes não muito grandes, provavelmente a distâncias radiais que não ultrapassam três raios terrestres, com freqüências entre aproximadamente 20 e 800 kHz e atinge picos de intensidade em freqüências próximas a 250 kHz. As fontes são mais comumente encontradas por volta de 22 MLT6 (hora magnética local) e 70° de latitude, tanto no hemisfério norte quanto no sul [20,21].
A potência total estimada que e liberada pela AKR atinge picos da ordem de 109 W, sendo comparada com a máxima potência dissipada pela precipitação de partículas aurorais, da ordem de 1011 W. Isso indica uma eficiência de conversão de energia da ordem de 1%, fazendo da mesma uma emissão extremamente intensa [17]. Por essa razão, a blindagem proporcionada pela ionosfera e providencial, uma vez que uma fonte de radio com uma potência equivalente à de uma grande usina hidroelétrica dirigida diretamente para a superfície terrestre comprometeria de forma drástica as comunicações no intervalo de freqüências de rádio em todo o planeta.

10. HILDCAAs

As “atividades contínuas do índice AE, de longa duração e de grande intensidade” HILDCAAs (do inglês High Intensity, Long Duration Continuous AE Activity) são uma outra espécie de atividade magnética, descobertas por Tsurutani e Gonzalez em 1987 [22,23].
Esses eventos foram identificados durante o estudo de algumas tempestades magnéticas que apresentavam a fase de recuperação muito prolongada, podendo chegar a mais de uma semana. Nesses períodos, o índice AE apresentou uma atividade intensa e contínua. A longa recuperação se deve à contínua injeção de íons na corrente de anel causada pelas HILDCAAs, retardando o decaimento esperado dessa corrente. Essas injeções ocorrem mesmo que não haja um campo magnético sul contínuo. Já no seu descobrimento, foi mostrado que as HILDCAAs estão correlacionadas com flutuações Alfvênicas no vento solar e foram definidos quatro critérios básicos para a classificação de um evento como HILDCAA [22,23]:
  • O evento deve ocorrer em períodos que não correspondem à fase principal de uma tempestade magnética.
  • O evento deve durar no mínimo dois dias.
  • Pelo menos uma vez durante o evento o pico do índice AE deve atingir valores maiores que 1000 nT.
  • Não podem acontecer quedas em AE para valores abaixo de 200 nT por períodos consecutivos maiores que duas horas, ou seja, a atividade auroral deve ser aproximadamente constante.
A causa das atividades geomagnéticas do tipo HILDCAA é a componente sul do campo magnético interplanetário associado às ondas de Alfven7 [24], levando à reconexão magnética.
A ocorrência das HILDCAAs é mais comum nas fases descendentes da atividade solar, pois é nessas épocas que ocorrem mais emissões de feixes rápidos provenientes de buracos coronais, fontes de flutuacões Alfvênicas [7,22].

11. Considerações finais

Esse artigo apresenta uma breve revisão sobre os principais efeitos da interação do vento solar com a Terra. Com base em todos os aspectos analisados nesse trabalho, é evidente que o estudo das condições espaciais nas proximidades do nosso planeta é de extrema importância. O perfeito entendimento dos processos de liberação da energia solar dentro da magnetosfera terrestre, seja na forma de um aumento no número de partículas ou como aumento de radiação, permite uma melhor aplicação das tecnologias atuais, assim como um desenvolvimento mais conciso de tecnologias futuras.

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